Do inadmissível castigo<br> ao novo regulamento disciplinar da GNR

Rui Fernandes

«A coragem consiste não em arriscar sem medo,
mas em estar decidido quanto a uma causa»
Plutarco

O presidente da Associação dos Profissionais da Guarda (APG) cumpre um castigo de 25 dias de suspensão. As razões desse castigo, um dos últimos actos do anterior comandante geral da GNR, derivam de declarações proferidas na sua qualidade de dirigente: uma manifestando preocupação com o impacto de uma determinação para corte no combustível e o seu efeito na capacidade da GNR cumprir as suas missões; outra sobre a questão de os postos superiores da Guarda continuarem a ser preenchidos por oficiais oriundos do Exército, inviabilizando tal prática que oficiais oriundos da GNR possam progredir na carreira; e, por fim, a opinião por si expressa acerca da intenção do Governo, que a dado momento alimentou várias notícias, de retirar competências à PSP passando-as para a GNR.

Eis o «crime» cometido pelo presidente da APG César Nogueira. Sobre matéria idêntica expressaram-se dirigentes associativos de estruturas sócio-profissionais da PSP sem quaisquer consequências. Qual é então o problema? O problema é que uns, os da GNR, mantêm um aberrante estatuto militar, sendo que, na prática, executam missões similares às da PSP. O problema é que, à falta de soluções para os problemas concretos que afectam os profissionais da GNR, pretendem por via da cachaporra selar-lhes os lábios, na impossibilidade objectiva de lhes impedirem o livre pensamento e juízo crítico sobre a sua política. O elevado grau de participação de profissionais da GNR nas recentes manifestações promovidas pelas forças e serviços de segurança dá bem a expressão do grau de descontentamento existente, porque a inapagável realidade é que no seio da GNR um crescente número de profissionais tem vindo a procurar, dentro de si, a razão pela qual não se sentem homens e mulheres livres. Se é verdade que foi o anterior Comandante Geral da GNR, Newton Parreira, a castigar, é também verdade que só o fez com o beneplácito do ministro Miguel Macedo, que é peça de um Governo que tem o recorde de atropelos à Constituição da República.

É neste desenvolvimento que surge o novo projecto de Regulamento Disciplinar da GNR, reforçando a alçada e a respectiva punição para os profissionais da GNR na reserva e na reforma. Pretendem mesmo que alguém reformado possa vir a ser expulso da GNR ou sofrer corte na pensão por, por exemplo, participando numa manifestação, proferir declarações que no entender do Governo ou do Comandante Geral afectam a imagem da Instituição. Outro mimo desta proposta de regulamento disciplinar são as penas acessórias, ou seja, um membro da GNR é castigado e, além desse castigo, pode ser transferido compulsivamente, ficando deste modo aberta a porta para a implementação de cordões sanitários para os supostos inconformados.

A razão do castigo aplicado ao presidente da APG e os conteúdos destas alterações ao regulamento disciplinar da GNR são parte de uma mesma concepção profundamente reaccionária de quem não aceita o debate, mesmo com as regras que estão estabelecidas para forças desta natureza, e acha que quer, pode e manda, e que o que resta aos membros da GNR é portarem-se com juizinho e aceitarem submissamente serem braços armados dos governos de ocasião.

Acontece que não estamos no tempo de Esparta e os Persas de hoje sabem dizer a palavra Não!

O longo mas curto caminho percorrido pelos profissionais da GNR e, em geral, pelos profissionais das forças e serviços de segurança, mas também os das forças armadas, mostra que, como disse Saint-Exupéry «Ainda que os teus passos pareçam inúteis, vai abrindo caminho, como a água que desce cantando da montanha. Outros te seguirão…». E por isso a luta continua!

 



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